Foto-textos


ENTRE AMIGOS

São seres brincantes
De cores brilhantes

– São puros dígitos –

De convívio ingênuo
E de humor bizarro.



ENTRE AMIS 
ou
ZOOPHILIE
(Amour entre les animaux)

Ce sont des être plaisanteurs
De couleurs brillantes

– Ce sont de pures chiffres –

De coabitation na
їf
 et de d'humeur bizarre.

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ESFINGE


A esfinge mente e se diz mulher

A ex-fera se arredonda, transmuta em mel

A lua é sol ameno, sem calor

O sol é lua efêmera, sem ardor

out/2018



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CARNE E CRUZ DA SILVA

A carne cruza o mundo e se vai

A cruz crucifica o corpo, que se trai

Em comunhão, a vida e morte se encontram, 

Tocam-se, beijam-se, retraem-se em vão.





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HISTORIOGRAFIA MEDIEVAL

A carne queimada - esvai-se em dor
A alma purificada - evapora-se
O fogo clareia a escuridão
As bruxas se purificam - não pedem perdão
O povo carrasco se delicia
Os soldados, armados, coitados, cumprem a missão:
Sobra a vida matadora, maltratada
Sobra a morte vivida da dor
Sobra a clareira e a escuridão.







HISTORIOGRAPHIE MEDIEVALE

La viande brûlée – s’évanouit en douleur
L’âme purifiée – s’évapore
Le feu éclaire l’obscurité
Les sorcières se purifient – elles ne demandent pas pardon
Le peuple bourreau sé regale
Les soldats, armés, les pauvres, remplissent la mission:
Reste la vie meurtrière, maltraitée
Reste la mort vécue de la douleur

Reste la clairière et l’obscurité.

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Se foi, 2015

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A MULHER E A LUA

Pôr do sonho – sol.
Luando a lua – lindo.

Estrelando a vida – luz.

A mulher e o mundo – puro sonho.


(José Augusto Silveira)
/2015



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RODOPIO

Gira mundo

vira gente

viva a roda

que gira,

que gera a vida.

/2015



TURBILLON

Tourne monde

Devient les gens

 Vive la roue

Qui tourne

Qui fait tourner la vie.

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REFLETINDO A MORTE EM BRANCO E PRETO

A morte é morte, seja branca, seja preta.

A morte não é branca, não é preta: é cinza.

A morte é europeia mas é africana também. 

A morte é minha, é sua, é de todos nós. 

/2015




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SOMOS AINDA E SEMPRE SELVAGENS


Somos guerreiros que falam da Paz

Somos deuses que criam novos deuses

Somos o tudo, somos o nada

Somos nós. 


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Série NU - 1


É mulher, é nua, é pop.
É sensualidade, é Modigliani.
É apropriação, é ressignificação, é arte?
É meu, é dele ou é nosso?

/2014


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O SILÊNCIO /2014


No silêncio das formas, na vibração das cores, o moleque grita em vão.

Grito silencioso ouvido com os olhos: é só desespero, é só emoção.

Apavoramento estético, não-ético, comum da nossa danosa civilização.

Silêncio contido de uma vida amordaçada, de moleque, de indignação.

Agora, finalmente expresso em cores primárias, em formas as mais simples, mas talvez em vão.

Na superfície da tela, na profundidade dos nós, ele diz não, não e apenas não.



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PÁSSARO-REI / 2014

Turbilhão rodopiante:
tipos diversos, confusos e fragmentados,
sugados, 
flutuantes na desesperada queda.

O pássaro-peixe silenciosamente plana.
Paira altivo, despreocupado e soberano.
Sobrevoa, sobre tudo, sobre todos, sobre o nada.

Ele voa, ele nada,
ele é pássaro, ele é peixe.
Ele é o rei, mesmo sem coroa.




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AFETO 


A arma dispara a-feto

A arma dis-para-desafeto

Desafetada, a arma silencia

No silêncio, apenas o afeto.


/2014


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AS FOLHAS / 2014


As folhas nos dão – vida

As folhas nos dão – abrigo

As folhas nos dão – paz

As folhas, um dia – caem

As folhas se vão – voam

As folhas se desfazem – fertilizam

As folhas – outras virão.

'Embaúba - Folha 1'

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DEPRESSÃO ONTOLÓGICA / 2014


Adormecido, o embrião espera – o nada.
Em seu mundo aquoso de azulado sonho – dorme.
Não quer emergir das águas rasas – seu útero.
Não quer – só quer ... não acordar.


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EMBRICIAL – ANTES DO ANTES

Antes do Antes era apenas o antes.

Era vibração primordial – mas não vibrante.

Era coloração primordial, mas descolorida.

Era Vontade – mas sem vontade. 

Era antes de tudo e de todos, antes do vazio, antes do nada. 

Nada nada, do nada, apenas nada. 

Nada, no entanto, que produz "oTudo".

"OTudo" que sem fim é somente "oNada".



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ALÉM DO BEM E DO MAL


Há deuses que existem, há deuses que não existem.

Há deuses que nascem, há deuses que morrem.

Há, ainda, deuses que nunca morrem.

Há, sim, também, deuses que já nasceram mortos e os que ainda irão nascer.

São muitos os deuses, talvez, nenhum.

Mas para que importa tantos deuses? Mortos ou vivos, que diferença faz?

E aí, uma outra pergunta vem:

Quem realmente são esses complicados deuses que nos confundem tanto? Serão eles, somente nós mesmos?

Ou serão apenas produtos de nossa louca e carente imaginação?

Não sei. E, quem sabe, eles também não saibam.

José Augusto Silveira

18/agosto/14 


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OUTONO AMENDOADO, 2014


A folha única predomina. É livre e rígida como uma rocha. Sua verde idade é manchada de um vermelho fúngico e incandescente. É Sobreposta e subposta pela esfera de um planeta azul que a perfura, que a encobre e se revela, vivo, leve e vibrante: em paz.


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DANÇANDO SONHANDO


Dançando sobre mim - o sono

Sonhando sobre mim, eu danço

Sobre o sono, uma dança

Sobre a dança, puro sonho



18/fev/2014 

Flutuação orgânica 
Série Xerox n.4 /1992

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MAGIA, MULHER E LUA, 2014


Acima da cintura, mulher.

Acima da mulher, lua.

Abaixo da cintura, serpentes.

Das serpentes, nuvens, nuvens nubentes.


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SOMBRAS DANÇANTES II

As sombras dançam, flutuam sobre o chão. São mágicas, silenciosas em sua canção. Mas dizem tudo sem dizer nada. Não nadam. Não andam. Apenas deslizam no chão.

/ 2014 


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MÃO E CONTRA-MÃO


Abre na mão um corpo inteiro.

Abre no chão um vendaval.

Flecha no ar, um sol e mar.

Fecha na terra um só luar.

Nasce da vida, morre um senão.

Morre do trem, três ou quatro vinténs.

Tem sido assim, batido o sino.

Tem sido assado, animal dependurado.

Nada não tem, tudo não dá, 

incerto no certo, está tudo inquieto.

A vida a morte o mundo o aberto.




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O DITO E O VISTO, 2014

Criação e Produção: 
José Augusto Silveira e Alvaro Nassaralla




O início



Existia o que, antes da luz? Antes da cor, o que existia?

O que existia antes da forma, do dito e do não dito? E, finalmente, antes da própria existência, o que existia?

Não, não creio saber responder a esse enigma em sua plena racionalidade. No entanto, creio fortemente que a existência existe, sempre existiu e sempre existirá.






Cosmogênese

       Cosmovisão de um cosmos ainda não dito. Visão dita de um cosmos apenas imaginado no seu sonhado início , sinuosamente colorido, prenunciando sua própria existência, agora já pensada, agora já dita e agora também vivida.





A dança dos Sóis

Sois sóis a luz dançante e vivificante dos vazios do mundo como do mundo da própria vida.
Visibilidades fulgurantes, calóricas, efervescentes que tudo transmutam eternamente criando os lugares e as coisas. Sóis que também incendeiam destruindo o feito para que, desfeito, seja de suas cinzas novamente refeito.





O Grumo



Grumos, somos nós seres grumosos, complexados e eternamente insatisfeitos de sermos apenas grumos e não deuses. Criamos, então, para suprir nossas carências e infinita angústia, deuses transgrumosos alguns monstruosos e outros semelhantes à nós mesmos. 



Fitoforma de Fato

A vida como fato se fitoforma em sua diversidade, se autofita em vistas e fitas coloridas, de verdes que se avermelham de vermelho carmim de sangue , transubstancializando-se em seiva revitalizante  fitoformadora da vida.





Algas, Elgas e Olgas



Algas, Elgas e Olgas ou Elgas, Olgas e Algas. Enunciados vários, aparentados por suas finitudes e ao mesmo tempo por seus ilimitados arranjos que possibilitam a sua própria transcendência. 
Ditos fragmentados em Algas, Elgas e Olgas, mas se tornando apenas “um” em sua poesia e musicalidade.

Dito que não diz nada e diz tudo ao mesmo tempo. Dito que por sua poesia pode nos levar ao sublime.  Dito que, pelo poder da imaginação, preenche de outros sentidos aquilo que já existiu ou que fazemos existir e, quem sabe, o que sempre existirá.




Transparências vegetantes

Transparências vegetantes que aos poucos se traduzem em formas. Formas de translucidez multicoloridas que flutuam interpenetrando-se sem parar e mantendo, ainda assim, suas individualidades.
Corpos efêmeros, diáfanos, cujos interiores se externam em uma superfície membranosa, geleificada e não limitante. Estruturas que ainda se constróem, solidificam-se e, se tornando opacas, com o tempo se liquefazem e se fundem na eterna substância plasmática universal.  



O Arvoredo

Trançado em enredamento de vidas entrelaçadas em curvas que se interpenetram profusamente e profundamente;  externando seus ramos folhosos e florosos que espargem sementes muitas e diversas em superfícies ora rochosas, ora terrosas ou mesmo aquosas; germinando em novos, mais novos, iguais mais diferentes de arvoredos outros.



Seriado Zoomórfico

Zooastro Terráquio modificante de formas vividas, seriadas, interligadas por uma essencialidade primordial, espontaneamente evolutiva. Evolução cujo ápice resulta no Homo, no Sapiens e também no Demens. Evolução que desentende tudo, mas que é inverdade da imaginação louca e libertária que é a verdadeira loucura da louca nossa vida, vivida e morrida a cada dia.





Lutando  pela sobrevivência

Na terra árida, a avestruz procura seu alimento. Em suas areias quentes, enterra a cabeça para esquecer as frustrações e desesperanças. Enfim, esquece-se de si, desilude-se do aqui e do agora. Desmotiva-se totalmente de viver sua existência como apenas finita mas, também, e, principalmente, rica em experiências e criatividade.
Como avestruzes, não queremos mais olhar para a terra nem para nós mesmos, mas apenas para o céu.  Criamos, então, os deuses, nossos novos patrões, aos quais obedecemos de olhos fechados.  Perdemos, assim, toda a nossa liberdade, tornando-nos apenas servos do transcendental.
Pagamos um alto preço: passamos a pertencer, então, ao reino do “deve ser assim” e perdemos o direito inquestionável de escolher o que realmente somos, fazemos ou queremos.




Profundezas Oceânicas

Oceanos diversos com suas profundezas misteriosas e suas superfícies, ora revoltas em tsunamis ora em calmarias que imobilizam o nosso ser.
Oceanos sonoros que nos falam como estrondos das ondas ou como o borbulhar de suas espumas.
Oceanos internos e externos a nós e que nos envolvem, nos afogam, levando-nos agonizantes para o bem fundo, local escuro, silencioso e denso a partir do nada, vazio do que já existe, mas no entanto repleto do que ainda possa existir.




Pássaro e as Estrelas

A ave que se ergue pode já testemunhar a beleza do firmamento. Já consegue ver as estrelas, já é capaz de perceber quão sublime pode ser o mundo.
Mas para vivenciá-lo precisa saber voar alto, muito alto, sem ter medo de nada e acreditando poder satisfazer tudo aquilo que desejamos, como também encontrar os “tesouros” resultantes de nossa rica e poderosa imaginação.




Asas para voar

A ave primeira levanta seu voo rumo ao desconhecido. Ela é a que lidera. É ela quem tenta encorajar suas companheiras, ainda imóveis, ainda indecisas, ainda pesadas e presas à terra.
O voo é, ao mesmo tempo, fácil e libertário para as que têm coragem e impossível para as que se apegam ao seu próprio tempo, em sua única e mesma terra.
Passam, assim, suas vidas paralisadas em um mesmo lugar ou fazendo pequenos voos: voos de pequenas distâncias, insignificantes. Não voaram alto por entre as nuvens. Não chegaram perto das estrelas. Não viram os campos e cidades bem do alto. Simplesmente recusaram o grande presente da natureza: a vida como liberdade de voar.





Avis Flamejante / Ordenando o Mundo

O animal alado faz seu próprio caminho na natureza. Ele ordena, coordena tudo o que é natural. Ele é pura força, é poder, é o que comanda.
A natureza em sua sabedoria se curva, se abre para o pásssaro de fogo passar. Parece que está vencida, mas na verdade vence.
O pássaro alado passa, se cansa e um dia morre.
A natureza permanece. Sobrevive a quase tudo, submissa apenas ao imenso e misterioso cosmos.




A Cisne / A Essência do Feminino

Essencialmente mãe, é a forma feminina em sua plenitude. Domínio cuidadoso e absoluto do outro que nunca cresce mas que sempre tem razão, que sempre precisa ser acolhido. 
Feminilidade que se culpa sempre de nunca ser o que gostaria de ser.
Ser descontrolado, sempre insatisfeito pelo seu descontrole: lamenta, chora e ri, tudo ao mesmo tempo.
Criatura que, impulsionada pela sua própria insatisfação, cria sempre a partir de sua angústia de existir para o outro, sempre e sempre mais.   
Cria o outro, cria o mundo, sempre se recriando como o tudo e o nada, que é simplesmente ser mãe. 




Magia Feminina

Terra, Mãe, Mulher: mãe de tudo e de todos nós. Mãe das mães. Poderosa força mágica que a tudo inicia, que tudo cria, que tudo transforma. Imaginação louca da essência feminina, que pretende controlar a tudo que ama. Ordena sem certeza plena de nada: pura intuição prazerosa, sensualizada , sexualizada, que despreza totalmente a razão e, mesmo, a desrazão, mas que se superpõe e se confunde com o próprio “vir a ser” da Natureza em sua eterna transformação.





Animalidade Humana/ A essência masculina

A carne matada que alimenta, a caça que sangra até a morte. O caçador apenas caminha e caça, apenas vive , sobrevive na sua animalidade fundamental. O caçador, no entanto, filosofa profundamente em sua práxis de simples sobrevivência e profunda organicidade em relação ao mundo. Ele é apenas o mundo, estando – ele mesmo – no mundo.





Dança e Magia/ Sombras Dançantes

As sombras dançam, flutuam sobre o chão. São mágicas, silenciosas em sua canção. Mas dizem tudo sem dizer nada. Não nadam. Não andam. Apenas deslizam no chão.





Trombetas e Pássaros

As trombetas mágicas soam e os pássaros fantásticos, agora acordados, fazem sua revoada iniciando mais uma etapa da civilização. Ambos sinalizam o chamamento à liberdade, a transmutação, e a descoberta de outros novos mundos.





Fantasmagoria Etrusca

Somos ainda Etruscos. Guardamos nossos velhos fantasmas e nossa animalidade primordial.
Fantasmas esses que dançam, que brincam, mas que querem controlar a essência selvagem e imprevisível desses animais. Esses, por sua vez, brincam e rugem ao mesmo tempo, rugem pela sua liberdade. Não querem ser mais nem menos do que animais.
Decisão difícil: sermos espíritos civilizados e cultos ou apenas instintivos, egoístas, não racionais, vivendo plenamente de nosso gozo e em total comunhão com a natureza.




A Caverna de Platão

Embriões acocorados, acorrentados por sua própria ignorância de um mundo dito real.  Percebiam apenas as sombras da realidade lá de fora. Não se apercebiam e não percebiam outras realidades. Eram apenas prisioneiros de si mesmos pois não filosofavam.
Conheceram a filosofia, voaram alto no conhecimento e continuaram equivocados, achando que tudo conheciam e, pior, que a tudo controlavam.
Desastre total: guerras intermináveis, sofrimento para quase todos e alguma felicidade para muito poucos. Conheceram o mundo sem sentirem verdadeiramente o mundo.




Gnosticismo Naif

Os deuses pagãos, engraçados, irreverentes e críticos, nos observam e riem. Eles são sábios e também muito ridículos: até parecem conosco. 
E os anjos e as estrelas, por sua vez, convivem no céu do encantamento, na transcendência sutil, agora perdida em nossa contemporaneidade.
O nosso céu, também, inicialmente dourado e transcendente, transforma-se – com o passar do tempo – em um céu sem anjos e sem deuses: apenas científico, tecnológico,  astronômico e absolutamente desencantado.
Enfim, o céu de nossos dias perdeu todo o dourado de sua transcendência, todo o seu azul celestial de pura espiritualidade. Agora, do firmamento, pouco se pode ver além de uma somente densa névoa acinzentada produzida pela poluição do ambiente e, pior, pela própria decadência e falta de encantamento da mente humana.  




Fadas, fadas e fadas ...

As fadas existem na fantasia das crianças e dos jovens.
As fadas existem como as protetoras do sono e produtoras dos sonhos infantis. As fadas existem: são entes de verdade nas brincadeiras e devaneios da criança.
As fadas, ainda, existem povoando os bosques, os jardins, os palácios e cabanas nas estórias infantis.
As fadas modernas estão na internet, tuítam, digitalizam-se nos jogos e aplicativos usados por todos nós.
As fadas existem e continuam encantando o mundo, mas já como pura mercadoria, vendida e comprada nos shoppings, nos mercados e, também, presentes na mídia em geral. 





Angústia criativa

A angústia, a melancolia e a loucura, ora criativas, ora paralizantes, estão sempre presentes naqueles espíritos mais sensíveis, como os artistas e os filósofos, nos homens e nas mulheres e, mesmo, nas crianças. 





Navegar é preciso: Singrando os mares e sangrando os corpos

Os navegadores de outrora, em sua extrema ingenuidade, singrando os mares na tentativa de encontrar o novo, trazem equivocadamente o seu próprio e velho mundo. Aportam, no entanto, em um mundo apenas aparentemente novo, pois já contaminado e envelhecido no exato instante de sua descoberta.
Dessa aventura não tão humana, resultam encontros e desencontros que sangram os corpos, que degradam as almas, novas e velhas.
Por que tanta cobiça, tanta falta de humanidade, tanto desespero, tanta angústia, tanto medo pelo que sequer foi descoberto de verdadeiramente novo? O que realmente faltava naquele tempo longínquo e de intrépidos navegantes?
Faltava justamente o que não poderia faltar, o que ainda era impossível de ser imaginado: a necessidade da descoberta de nós mesmos, reinventando-nos libertos daquilo já existente, abertos e livres para a construção do nosso próprio e descontaminado novo mundo. 




Civilizando o Tempo

O vôo do tempo, civilizado e relogizado, distanciou-se da natureza. Agora, o passado e o futuro pouco significam. Estamos presos a um presente eternizado ou, mesmo, a um tempo presente assassinado e substituído pela pura espacialidade. 
Tempo, agora, em que não há mais tempo: consumido, engolfado e vomitado pelo próprio tempo. Vivemos, então, o tempo sem tempo, sem tempo para nada, pura ação, puro espaçamento sem tempo: temporal transbordante do nada. Assim é a vida do consumo e do sem tempo.

Segundo tempo:

O tic-tac, o Black Block
O tic-tac da espera
O Black Block da explosão
Nem tic nem tac
Nem Black nem Block
Apenas você
e o tic-tac e o Black Block do coração.




Saudando o Racional

Maldita e bendita seja a racionalidade. Racionalidade que pode levar aos céus os pensamentos mais nobres, mas que também desmerece e cala totalmente o sentimento do corpo. Racionalidade que dá sentido e que também legitima e faz compreensiva a exclusão. Racionalidade, algumas vezes, benéfica, controlando a barbárie; outras vezes, até perversa, causadora dos males da civilização.
Saudemos, então, com cautela a Racionalidade. Saudemos, também, o afeto e a emoção para que, acompanhados da razão, transformem  homens e mulheres em pensadores que criam, que sentem, e que partilham suas preocupações e desejos para com o mundo.




Africanidadeas cores e as formas da exclusão

Africanidade em que as máscaras de mil formas e coloridos diversos relembram sua liberdade e alegria do passado,  mas também escondem as faces tristes de uma exclusão perversa em pleno período das luzes e da tão enaltecida racionalidade humana.  É a total irracionalidade, até mesmo extrema desumanidade, coexistindo com o assim chamado desenvolvimento civilizatório do Ocidente.
A África, fragmentada, explorada pelos velhos e novos donos do mundo, pede socorro. Suas máscaras, mesmo de grande beleza, não podem servir como encobrimento de uma grande tristeza, de uma grande injustiça.
África, queremos ver suas máscaras coloridas mas também seus rostos negros e sorridentes, plenos de felicidade.




Produzir, consumir, poluir …

Nosso mundo produz e produz muito: produz em excesso.
Nosso mundo consome, consome muito: consome em excesso.
Nosso mundo polui, polui muito: polui em excesso.
Muita gente, muito carro , muito tudo.
Gente sem espaço para morar, carro sem espaço para estacionar.
Coisas demais que não conseguimos usar.
Poluição demais, capaz até de nos matar.
Assim somos: até quando?





Profecia Escatológica: a Flor de Hiroshima

Visibilidade única e inesquecível. Flor maldita. Uma quase finalização trágica de nossa civilização, enlouquecida naquela época por uma bestialidade jamais vista. Homo não-Sapiens e totalmente Demens. Homo Faber mas, sim, da própria morte, do terror e da desumanidade. Produtor das flores mortais de Hiroshima e Nagasaki.
Aviso estrondoso, nuclear, de luminosidades penetrantes que a muitos cegaram para sempre.  Aviso talvez primeiro e talvez único da desvairada capacidade de nos destruirmos e ao nosso próprio mundo.
Os sóis dançantes da vida reaparecem em nossos céus. Dessa vez, transmutados em agentes de morte e de destruição.  Milagrosamente sobrevivemos: traumatizados e cambaleantes, tentando mais uma vez reiniciarmos a caminhada rumo a vida com muitas incertezas do que ainda possa acontecer.
Não tínhamos a convicção plena e, sim, e apenas, uma enorme esperança de voltarmos a ser simplesmente Homo Sapiens Sapiens, e não mais o terrível e mortífero, totalmente desumano, quem sabe até inumano, Homo Demens e Demens.  





Útero Hemorrágico, a vida se esvai

As catedrais de úteros que sangram agora choram os filhos que se foram. São as mães desconsoladas, em profundo luto, são apenas sombras sem almas pois que acompanharam  o que a morte levou.  No entanto, o tempo não para de passar. As mães se tornam filhas que já novamente sorriem. Já recuperaram suas almas e agora procriam. São as novas mães gerando novos filhos, novas esperanças para –quem sabe – um mundo melhor.





O coração ainda bate, mas triste
pelos que se foram e preocupado
pelos que ainda vêm ...

Após a batalha, alguns corações – os sobreviventes – apenas batem, vitimados pelo horror entranhado na própria carne. Seu ritmo e dizer tristes parecem acompanhar um réquiem. Seu pulsar se descompassa ao sabor das más lembranças ainda não deixadas para trás.
São corações machucados, cansados, quase mortos, lutando para sobreviver. 






... e só resta brincar com a morte.

E a visão da morte não desaparece de nossas mentes.  Reaparece, sempre e sempre, aterrorizando e lembrando a presença morticida e genocida de uma época ainda próxima, e de tanta loucura e extrema desumanidade. 
O tempo passa e, com ele, aos poucos, as lembranças se esvaem. Transmutam-se em outras coisas mas que no fundo são as mesmas.
A morte, com seu semblante de terror, agora dança.  Agora se mostra leve. Mesmo, engraçada. Puro entretenimento. Pura lembrança fantasiosa de uma época passada.  Entretanto, não nos iludamos:  o que  agora prazerosamente vivenciamos, continua a ser a própria morte que, a qualquer momento, pode se aborrecer, tornando-se outra vez terrível – sendo outra vez a assassina e a desgraça de todos nós.
Sejamos, então, prudentes e muito cuidadosos.





Agora somos apenas Máscaras ...

Máscaras que se revelam.
Máscaras que nos ocultam.
Máscaras que se distorcem, disfarçando-se em outras máscaras.
Máscaras que tomamos como nós. Máscaras, algumas dadas, outras compradas, outras forçadas.
São apenas máscaras: não nós.





A onça e o gato, o Naif e o Pop

A onça, animal feroz, é apenas um enorme gato. O gato, afetivo, companheiro do seu dono é apenas uma pequena onça. Somos, nós, onças ou gatos conforme nossa própria escolha.
Grandes e selvagens, dominadores perigosos, mas sempre lutando pela sobrevivência, caso escolhamos ser onça; pequenos e quase domesticados, amigos dos da casa, contudo de barriga sempre cheia, caso escolhamos ser apenas gato.
Pasmem, a escolha é nossa.




Cavalinho de pau, sonhos da infância

Brinquedo de criança, pois em seu próprio vai-e-vem sempre vai como também sempre vem. Vai a qualquer lugar desejado e vem sempre sem se importar de onde veio. Criança que apenas brinca, balança-se sem limites de tempo ou de lugar. É a pura criação, pura ingenuidade, puro se aceitar em sua fantasia.
Isso é o artista, livre de tudo e de todos, mas convicto e obstinado pela sua liberdade e pela sua criação. Artista e criança. Artista é apenas criança, apenas inocência e criação. 





A Modernidade em Branco e Preto

Diagrama estratificado de uma topografia constituída de linhas retas ou curvilíneas, de buracos interpenetrados por estruturas perfurantes e perfuradas que desaparecem para renascer não se sabe aonde. Realidade constituída pelo engolfamento daquilo que está fora se constituindo em aquilo que está dentro. Lugar não-lugar, nem dentro nem fora, fora e dentro, por isso ilimitado, finalmente liberto do já constituído e limitado, que é sempre o mesmo, impondo-nos a ver,  a fazer, a pensar sempre e sempre o mesmo.
Agora a Ágora se desfaz e temos a possibilidade da emergência de puras subjetividades, centradas verdadeiramente em si mesmas, geradoras de verdades, de poderes e de saberes, produzidas por elas mesmas. Não estão mais inseridas: nem dentro nem fora. Enfim, uma nova espécie surge – dela própria, auto-criativa, demandando e exigindo a recriação de um novo mundo.
Esse novo mundo concebido de forma radicalmente autêntica e libertária, tão sonhado e desejado por aqueles considerados equivocadamente como loucos, nada mais é do que mundo da plenitude das artes e da completa realização criadora dos artistas.





Andróides / A Nova Caminhada ...

Os caminhos agora são outros como também o são os caminhantes. Os passos não se fazem mais sobre a relva ou sobre a terra nua. A relva não mais existe e a terra agora está coberta pelo que é artificial e metálico: é fria, é inóspita para os que ainda insistem em ter os pés descalçados. Os passos, agora, soam diferente. São metalizados como de metais são as novas criaturas, não mais humanas. São os – tão desejados para uns e tão preocupantes para outros – “pós-humanos”.
Não são mais os desejos, e sim as programações que conduzem esses novos seres. São seres-máquinas, apenas andróides: ficções ou uma realidade prestes a acontecer? 
Preocupante. O que considerávamos como o mais importante para o humano, o pensamento, hoje, torna-se cada vez mais raro. O pensar vem sendo, então, substituído pela ação puramente instrumental, por uma total desconsideração do passado, por um presente eterno e consumista e por um futuro inexistente.




Naturalizando a tecnologia ou
tecnificando a natureza ????

Pensamo-nos deuses criadores de nossa própria evolução. Aprendemos, agora, a sermos nós mesmos os sóis  que a tudo cria e que a tudo pode destruir.  Ainda somos aqueles sóis primordiais, mas também os sóis da modernidade.  Somos ao mesmo tempo a natureza pensante e também produtores  de toda a ciência e  tecnologia.
Somos, por isso, os responsáveis de nossos destinos , como também idealizadores, planejadores e produtores  de nosso próprio processo evolutivo. 
Nossa responsabilidade para conosco e o mundo se torna cada vez maior pois agora somos os decisores para o bem e para o mal. 
Sendo assim, não temos como não reincorporar toda a sabedoria que até bem pouco tempo pertencia , quase que inteiramente , aos deuses criados por nossa infinita fantasia.  Sejamos agora os novos sábios, os novos donos e donas de nosso próprio mundo. Esse mundo será  realizado pela capacidade produtora do homem mas também contando com os acasos do ainda misterioso cosmos.





O Reinício
humano, trans-humano ou não mais o humano ?

E os sóis não param eternamente a sua dança cósmica. Não param sua ação de construir, desconstruir e reconstruir tudo.  A existência continuará certamente a existir, independentemente de ser humana, trans-humana ou não mais humana.







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